publicado em 04/04/2022
A Medida Provisória nº 1.108 de 25/03/2022 editada pelo Governo Federal tratou de diversas questões, inicialmente relacionadas ao pagamento do benefício do auxílio-alimentação nos contratos de trabalho, multas e penalidades legais em caso de descumprimento e regras de dedução dessas despesas do lucro tributável, para fins de apuração do imposto de renda da empregadora.
Limitou-se a destinação e uso do auxílio-alimentação conferido pelo empregador aos empregados aos pagamentos em estabelecimentos de restaurantes e similares, e/ou aquisição de gêneros alimentícios, vendando antiga prática de uso de referidas verbas para aquisição de outros bens e serviços que não os alimentícios, o que era tolerado no comércio em geral, inclusive em aquisição de eletrométricos, pagamento de dívidas, etc.
Fica, portanto, registrado ponto positivo e moralizante pela propositura da Medida Provisória, ante a natureza alimentar essencial do benefício do auxílio-alimentação, que era em muito desvirtuado como verdadeiro salário e seu uso estimulado ou tolerado em outras finalidades. As empresas receptoras desse benefício devem, portanto, participar da efetiva observação e fiscalização do uso do benefício do auxílio-alimentação, sob pena de multas que vão de R$ 5.000,00 a R$ 50.000,00, podendo ser dobrada em caso de reincidência.
O ponto negativo que se faz é o uso de Medida Provisória para se incluir no art. 62 da CLT, nova exceção à regra à obrigatoriedade de marcação de ponto para os empregados em geral. Além daqueles empregados de mando e gestão, como por exemplo, gerentes gerais ou diretores de empresa, a depender da estrutura da própria empregadora, bem como aqueles que exerce suas funções externamente, sem a possibilidade de controle de ponto, a Medida Provisória acrescentou o inciso III, ou seja, aos “empregados em regime de teletrabalho que prestam serviço por produção ou tarefa”.
Caberá ao empregador, por exemplo, “negociar” diretamente com o empregado os parâmetros do trabalho por “tarefa”, não ficando claro quanto tempo o trabalhador deve ficar à disposição da empresa, ou se esta será realizada inteiramente fora das dependências da empresa. Em resumo, é a alocação do trabalho fora das dependências da empresa, geralmente na residência do empregado, de parte do processo produtivo, ou integralmente todo este.
Critica-se e já há insurgência de parte da sociedade e doutrina, se o teor dessa inclusão poderia ter sido realizado sem se seguir o processo legislativo ordinário, mediante projeto de Lei, pois possibilitaria maior discussão e aprofundamento da aplicação desses conceitos no cotidiano das pessoas e empresas.
Além dessa inclusão, referida Medida Provisória tratou de acrescentar o art. 75-B na CLT e disposições seguintes, tratando da definição do que seria o “teletrabalho” e o “trabalho remoto”.
Assim, essa outra modificação trazida pela Medida Provisória sobre o que seria o trabalho em “home office” com a utilização de ferramentas eletrônicas de comunicação, como o celular, tablet, computador, etc., fora da jornada de trabalho, deixam de contar como tempo à disposição do empregador. Parte da doutrina entende que isso reacende a discussão sobre o “direito à desconexão”, ou seja, se deve contar esse tipo de interação como trabalho, ou o empregador deve se abster de acionar o funcionário fora da jornada acordada.
A Medida Provisória ainda tratou da possibilidade de proibir a equiparação dessas atividades àquelas de telemarketing ou teleatendimento, deixando claro que esses trabalhos não se enquadram na definição de tempo a disposição do empregador, incluindo também esse tipo de trabalho para estagiários e menores aprendizes.
Por fim, a Medida Provisória trata da aplicação das normas brasileiras sobre o assunto em caso de empregado admitido no Brasil que optar pela realização de teletrabalho fora do território nacional, da obrigatoriedade dessa modalidade de trabalho sem expressa mediante acordo individual, não se admitindo contratação tácita, bem como na irresponsabilidade das despesas de retorno ao trabalho presencial de empregado que fez opção ao trabalho remoto, fora da localidade prevista no contrato.
Em resumo, de um lado, essas proposições e alterações na CLT, ainda que por Medida Provisória, indicam olhar mais dinâmico para a realidade de diversas atividades que já funcionam dessa maneira, sem regulamentação expressa. Contudo, de outra banda, indicam sinal amarelo para eventuais precarizações nas relações de trabalho.
De todo modo, essas alterações que tratam da regulamentação do teletrabalho e trabalho remoto, deveriam ser realizadas mediante processo legislativo ordinário, viabilizando maior aprofundamento da discussão dos diversos atores sociais, dos reais efeitos das alterações.